Do GG ao pp

domingo, 14 de junho de 2009

Trazida pelo mar


Quinze minutos separam o cais da praia Grande, no norte de Paraty, da ilha do Araújo, onde fica esta casa. Mas a pouca distância não ameniza a dificuldade para construir no lugar, um naco de terra de 1 km² cercado pelo mar calmo da região fluminense.

Por Eliana Medina e Rosele Martins
Fotos: Carlos Piratininga
Ilustrações: Fabio Flaks

“A travessia de alguns materiais é complicada. Areia e pedras precisam ser ensacadas antes de subir ao barco”, explica a arquiteta Iris Carneiro, gaúcha radicada na vizinha Ubatuba, no litoral de São Paulo. Nada disso, porém, assustou um paulista em busca de sossego, que encomendou à amiga Iris sua morada na ilha. Na lista de pedidos, simplicidade, área social ampla e espaço para guardar um barco. Todos atendidos no projeto de 131 m² finalizado em oito meses, três além do necessário para erguer uma casa semelhante no continente, avalia o empreiteiro: “O transporte consome muito tempo. Embora o trajeto no mar seja curto, dá trabalho carregar e descarregar tudo”, diz Marcos da Costa Monteiro Filho, há 30 anos tocando obras naquele pedaço. E se você está pensando em construir uma casa na praia veja também um projeto que foi feito para hospedar amigos e familiares e que também pode ser alugado quando estiver vazio.

A varanda percorre a fachada de uma extremidade a outra, oferecendo vista para a beira da praia. As toras roliças de eucalipto usadas como apoio para a cobertura viajaram 50 km da cidade paulista de Cunha até Paraty – onde a equipe que cuidava das travessias descarregou a madeira, lançou-a ao mar, amarrou os troncos a um barco e os rebocou até a ilha.

O piso da sala e da cozinha intercala réguas de ipê (30 cm de largura cada uma) e de pau-marfim (5 cm), protegidas com cera incolor. Os vidros fixos vieram da demolição de uma antiga lanchonete paulistana.

Usar tijolos à vista foi um jeito de reduzir os fretes: a dispensa de reboco cortou pela metade a quantidade de areia e cimento necessários à construção das paredes. O tom rosado do rejunte é do saibro adicionado à argamassa. O paredão de 6 m de altura demarca a entrada da suíte, que fica no topo da escada, e do outro quarto.
As ripas de peroba (Marupiara), madeira usada também nos caibros, formam uma espécie de grade que, sem vidros, permite a circulação do ar.
A suíte, com mezanino. No banheiro, uma camada de verniz (Solgard, da International) afasta a umidade da bancada de peroba. Já as aberturas receberam stain transparente (Osmocolor, da Montana Química).
A decisão de elevar a construção 2,85 m acima do solo também ajuda a mantê-la sequinha e confortável termicamente. Os pilotis são de pedra moledo, abundante na região. “O material está presente em muitos sobrados do centro histórico de Paraty”, aponta Iris Carneiro. As telhas do tipo capa-e-canal (Madeireiro) chegaram à ilha trazidas de Ubatuba.
O beiral de 80 cm de profundidade evita a entrada de chuva pelo ripado logo abaixo do telhado.
feito listrado
Visto de dentro, o telhado aparente forma listras. Elas são resultado do sistema de sustentação das telhas, baseado somente em caibros. O ganho estético, porém, pesa no bolso: consome quatro vezes mais madeira que o normal. O aumento ocorre porque a ausência de ripas (amparos dispostos horizontalmente) exige a colocação de caibros a cada 15 cm – com o uso delas, o intervalo poderia ser de 60 cm. O desnível interno da casa (veja no corte) reflete a topografia do terreno.
Apenas a área dos quartos está apoiada diretamente no chão, sobre uma fundação de sapata corrida.
O restante foi erguido sobre pilotis, liberando um grande vazio sob a sala e a varanda, o abrigo do barco. O estar dá acesso à suíte, um pavimento acima, e ao dormitório de hóspedes, no andar de baixo.